Cadernos de Saúde Pública
ISSN 1678-4464
33 nº.Suplemento 3
Rio de Janeiro, 2017
DEBATE
O risco de parcerias público-privadas em saúde pública pode ser classificado?
Vera Luiza da Costa e Silva, Silvana Rubano Turci, Ana Paula Natividade de Oliveira, Ana Paula Richter
http://dx.doi.org/10.1590/0102-311X00086316
Promoção da Saúde; Parcerias Público-Privadas; Políticas Públicas de Saúde
Introdução
O conceito de ação intersetorial para a saúde é usado, com frequência, para descrever parcerias de diferentes setores envolvidos na promoção da saúde pública, como por exemplo, para dar suporte à implementação e promoção de medidas de prevenção à exposição a fatores de risco, com melhorias na qualidade de vida, por meio de estímulo à realização de atividade física e o desenvolvimento de políticas de nutrição abrangentes, entre outras ações. Essas parcerias podem ser estabelecidas dentro dos governos envolvendo áreas tradicionalmente não relacionadas com a saúde pública, como economia e agricultura. Também podem ocorrer entre segmentos da sociedade, interessados em um determinado tema, como entre a sociedade civil organizada e o setor privado ¹.
As parcerias público-privadas (PPP) vêm despontando num cenário em que as instituições públicas, apesar de apresentarem credibilidade científica, não dispõe de recursos suficientes e emprestam seu nome em troca de patrocínio para a prevenção e tratamento de doenças, assim como para o desenvolvimento de pesquisas, tornando essas parcerias uma alternativa de financiamento de projetos e de infraestrutura ².
Embora não haja uma definição consensual do significado de PPP, o Conselho Nacional para Parcerias Público-Privadas americano as define como “um acordo contratual entre um órgão público (federal, estadual ou municipal) e uma entidade do setor privado, em que as habilidades e recursos de cada setor são compartilhados, resultando em um serviço ou em instalações para a uso do público” 3.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) descreve as PPP como uma união de um grupo de atores que tem como objetivo comum melhorar a saúde das populações, baseado em papéis e princípios mutuamente acordados 4. Corroborando essa definição, Reich 5 destaca que as PPP devem ser constituídas por três pontos. Primeiro, devem envolver ao menos uma organização privada com fins lucrativos e uma organização sem fins lucrativos. Segundo, os parceiros devem compartilhar esforços e benefícios. Terceiro, em se tratando de PPP em saúde pública, o objetivo comum dos participantes deve ser a criação de valores sociais para melhorar a saúde de populações em desvantagem.
Ativistas em saúde pública e pesquisadores têm criticado a formação de PPP por entenderem que pode haver distorção da agenda que define as necessidades da saúde pública, favorecendo os interesses das empresas. Tal preocupação tem fundamento porque muitos problemas que deveriam ser resolvidos por ações públicas acabam não sendo priorizados por influência de agentes não governamentais que as modificam de acordo com suas conveniências e interesses 6.
Não diferente do que ocorre em muitos países, o modelo de desenvolvimento adotado pela grande maioria das empresas que atuam no Brasil se fundamenta em corporativismo e na obtenção de lucro, assim como no investimento de grandes recursos em estratégias de propaganda e marketing para ampliarem sua clientela, além de dar mais credibilidade a seus produtos. Exemplo disso são os brindes oferecidos por indústrias farmacêuticas e de alimentos processados a profissionais de saúde com o objetivo de facilitar essa relação que, muitas vezes, ultrapassa interesses éticos que deveriam ser respeitados 6.
No Brasil, existem empresas que fomentam parcerias com instituições públicas da área de saúde para promoção de atividades socialmente responsáveis, como combate ao câncer infantil, corrida para a cessação do tabagismo, entre outras. Muitas vezes essas parceiras mostram flagrante contradição. Exemplo disso pode ser visto na participação de empresas na promoção de eventos para reduzir a obesidade e diabetes infantil, mas na verdade produzem alimentos ultraprocessados, calóricos e nutricionalmente pobres, que se constituem em fator de risco para doenças crônicas 7.
A revista Lancet em 2013 publicou os resultados de um estudo do Grupo de Ação para Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), que discute o crescimento da prevalência das DCNT no mundo e o papel das indústrias produtoras de commodities e de produtos insalubres. Essas empresas transnacionais são as principais responsáveis pelo surgimento da epidemia de DCNT e lucram com o aumento do consumo de seus produtos 8. Alguns exemplos clássicos incluem a indústria do tabaco, que tentou fazer acordos voluntários para evitar a regulação do conteúdo de seus produtos, bem como a regulamentação da publicidade e da propaganda, de modo a continuar a promover um produto que mata 1 a cada 2 consumidores e, estima-se, que até 2030 matará mais de 8 milhões de usuários 9. As indústrias de bebidas alcoólicas, de refrigerantes e de alimentos ultraprocessados vêm utilizando estratégias semelhantes às usadas pela indústria do tabaco para minar políticas custo-efetivas de saúde pública. Essas estratégias compreendem não apenas campanhas de publicidade enganosas, uso de embalagens como forma de promover o produto, ausência de informações sobre potenciais riscos do produto ao consumidor, exposição do produto em lugares de destaque e visibilidade voltada para crianças e adolescentes, entre outros 8,10. Também são demonstrados, de maneira cada vez mais frequente, grupos de organizações que pressionam os governos para impedir a adoção de medidas reguladoras dos produtos, incluindo a ação indireta dos grupos de fachada 11. Nesses casos, deve ser considerado o não estabelecimentos de PPP, tampouco a autorregulação, pois a intervenção do Estado é o único mecanismo que pode evitar/reduzir danos causados por tais indústrias, baseado em evidências científicas. Adicionalmente, pelo mesmo conflito de interesses, essas empresas não devem desempenhar nenhum papel na formulação da política nacional ou internacional para o controle das DCNT 8. O mesmo deve ser dito sobre os grupos de fachada dessas empresas, que não devem ser aceitos como parceiros.
Observando o histórico recente de leis restritivas com o objetivo de reduzir o consumo de fatores de risco, indústrias multinacionais como a de tabaco, bebidas alcóolicas, de refrigerantes e de alimentos ultraprocessados têm tentado influenciar governos para firmar acordos voluntários com a alegação de não sofrerem queda brusca no seu faturamento 12,13.
A indústria de tabaco não raro tem promovido eventos sobre cidadania, participado de fóruns que discutem o papel das empresas na manutenção de reservas naturais, e é membro do Pacto Global (UN Global Compact) das Organizações das Nações Unidas que prevê ações responsáveis sobre o meio ambiente, direitos humanos e trabalhistas 14. Contradição semelhante ocorre com a indústria de bebidas alcóolicas, ao patrocinar eventos esportivos e promover campanhas publicitárias direcionadas aos jovens, pois sabidamente seu produto está associado ao desenvolvimento das principais DCNT, como diabetes, hipertensão arterial e câncer; e suas estratégias de marketing funcionam mais no sentido de aumentar o uso do álcool socialmente e aumentar a prevalência de doenças 15,16.
A Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco da Organização Mundial da Saúde (CQCT-OMS) traz, entre seus instrumentos, um artigo específico e guias para sua implementação, objetivando lidar com a interferência da indústria do tabaco (Artigo 5.3) e encorajar os governos a proteger as políticas públicas de controle do tabaco dessas interferências 17.
No entanto, existem PPP desejáveis e viáveis. Os órgãos públicos podem se beneficiar da colaboração com o setor privado em áreas em que há falta de especialização, tais como desenvolvimento de pesquisas e tecnologias. Mas, mesmo nesses casos, os papéis que serão executados por cada instituição devem ser bem definidos antes de qualquer passo concreto, para que não haja conflito de interesses. Isso pode ser um desafio quando se trata da formulação de políticas públicas e regulatórias, particularmente sobre os impactos que determinadas políticas possam exercer sobre nações em desenvolvimento 18.
Este artigo discute quais parcerias público-privadas podem ser estabelecidas na área da saúde pública e como os governos dos países devem agir para se proteger quando houver conflito de interesses.
Metodologia
Este artigo procura refletir as diferentes estratégias usadas na formação das PPP. Para tanto, foi feita uma revisão narrativa de literatura, consultando livros, periódicos e literatura cinzenta, selecionados nas bases de dados LILACS, SciELO, PubMed e Periódico Capes, para artigos científicos e Internet para a literatura cinzenta. Os descritores e os respectivos termos usados nas buscas foram: parcerias público-privadas, parcerias AND saúde, parcerias AND promoção da saúde, parcerias AND prevenção de doenças crônicas não transmissíveis, políticas de saúde. Foram considerados para analise os documentos publicados no período de 1998 até 2015, tanto em inglês quanto em português. A pesquisa foi realizada no período de agosto de 2013 a abril de 2016.
Discussão
Para Kraak et al. 19, seis desafios devem ser considerados nas PPP com o objetivo de diminuir os riscos decorrentes dessas parcerias na área da saúde pública: (i) equilíbrio dos interesses privados com os interesses da saúde pública; (ii) gestão de conflitos de interesses e preconceitos; (iii) assegurar que associações na utilização de marcas apoiem produtos e ambientes saudáveis; (iv) cumprimento de códigos éticos de conduta; (v) realização de dupla diligência para avaliar a compatibilidade da parceria; e (vi) acompanhamento e avaliação dos resultados da parceria.
Países desenvolvidos como o Reino Unido, declaram ter conseguido pactuar metas que têm impacto sobre a saúde da população como a parceria que fizeram com empresas privadas do setor de alimentos e a redução nos teores de sal, o que consequentemente traz benefícios imediatos sobre a pressão arterial e sobre o desenvolvimento de DCNT. A sociedade civil desempenhou um papel importante nesta proposta, pois é ela quem monitora e fiscaliza o cumprimento desses acordos 20,21.
De fato, as PPP na área da saúde devem ser minuciosamente avaliadas e, com tal objetivo a Organização das Nações Unidas (ONU) criou o Comitê permanente que define regras para o engajamento com o setor privado. Esse comitê elabora manuais para orientar a interação, por exemplo, entre o governo e empresas de alimentos, observando que seja mantido o diálogo aberto e claro sobre potenciais conflitos de interesse e garantindo que esses aspectos sejam adequadamente gerenciados 22.
Outro bom exemplo são as orientações sobre estratégias que estão sendo adotadas para conter o consumo de bebidas alcóolicas. Essas diretrizes propõem a regulação do conteúdo, do volume de comercialização, seja ela feita mediante marketing direto ou indireto, em algumas ou todas as mídias; das atividades de patrocínio; sobre medidas restritivas de acesso ou proibição quando os produtos são destinados aos jovens 23.
Classificando parcerias público-privadas
O uso das PPP em saúde pública exige soluções inovadoras. Exemplos podem ser encontrados em diversos países e, desde que respeitadas as regras estabelecidas pelos órgãos reguladores dos governos, as PPP podem oferecer meios adicionais para a pesquisa em saúde pública. No entanto, o saldo entre perdas e ganhos pode não estar claro 24. De acordo com a análise dos autores, as PPP poderiam ser divididas em possíveis, possíveis com ressalvas e impossíveis.
Parcerias possíveis
Um exemplo de sucesso desse tipo de parceria é o Transport, Health and Environment Pan-European Programme (THE PEP), coordenado pelo Escritório Regional da OMS para a Europa, em que foram desenvolvidas orientações e ferramentas práticas sobre os efeitos benéficos para a saúde e economia adquiridos com a prática do ciclismo e caminhada. As peças de comunicação foram desenvolvidas com revisão sistemática de pesquisas relevantes que envolveram especialistas com ampla experiência e conhecimento nas áreas de saúde pública, epidemiologia, transportes e economia. As ferramentas geradas pelo projeto eram fáceis de usar e foram adotadas com sucesso por países de alta, média e baixa renda 25,26. Esses projetos mostram que o uso de argumentos econômicos para defender investimentos em políticas sociais pode eventualmente trazer claros benefícios para a saúde 27.
Outro projeto de sucesso envolvendo PPP foi o North Karelia Project, desenvolvido pelo governo da Finlândia nos anos 60, com o objetivo de reduzir as elevadas taxas de doenças cardiovasculares presente na população. Foram propostas mudanças no estilo de vida e de consumo da população, com a colaboração da sociedade civil e do setor privado aos setores regulatórios do governo, e também acordos com algumas indústrias, especialmente de alimentos. As taxas de DCNT caíram vertiginosamente e, até hoje, essa PPP é considerada um modelo que deve ser seguido por todos os países 28.
O Departamento de Saúde do Reino Unido, em parceria com a Agência de Normas para Alimentos do Reino Unido, considerou as recomendações do Comitê Científico Consultivo em Nutrição do Reino Unido (SACN) de que o consumo médio de sal da população deveria ser reduzido porque os níveis de ingestão eram, em média, da ordem de 9g/dia, e deveriam ser no máximo 6g/dia para os adultos e ainda menor para as crianças. Para que houvesse o efetivo cumprimento dessa recomendação, as autoridades do Reino Unido tiveram que trabalhar com vários setores da indústria de alimentos, incluindo os varejistas, fabricantes, associações comerciais, fornecedores da indústria, academia, organizações de voluntários e autoridades locais 20.
Parcerias possíveis com ressalvas
As PPP podem se traduzir em avanços para a saúde da população no presente, enquanto a criação de fluxos de inovação pode gerar futuros dividendos sociais e financeiros para reforçar a saúde pública de forma mais ampla. É necessária uma avaliação por parte da academia para que haja uma discussão científica fecunda e que contribua para um refinamento das PPP e gere diretrizes para a saúde pública 29.
Como o lucro é sempre o principal objetivo de uma grande corporação, há sempre que se pensar no foco da saúde pública antes de uma parceria entre saúde e uma indústria. Desde que o objetivo principal da parceria seja diminuir níveis de substâncias danosas à saúde.
No entanto, torna-se mais complexo firmar uma parceria com empresas que sabidamente comercializam produtos nocivos à saúde, como no caso das indústrias de refrigerantes, de alimentos processados (fast foods), biscoitos, e essas parcerias não tenham as salvaguardas de uma melhoria ou redução de substâncias nocivas. Para que haja um real ganho para a saúde pública, com melhor controle das DCNT, é preciso estabelecer compromissos de redução ou mesmo erradicação de substâncias prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente 7.
Dentre essas parcerias com salvaguardas, estão as indústrias dos alimentos processados, bebidas não alcoólicas (em especial os refrigerantes) e a indústria farmacêutica. Uma vez que os interesses industriais e corporativos não se sobreponham aos interesses da saúde pública, tais parcerias podem ser viáveis 19.
Com relação à indústria farmacêutica, é necessário avaliar se a parceria ou patrocínio de pesquisas em saúde não influenciam nos resultados, favorecendo a prescrição de medicamentos. Para Thompson 30, deve se considerar um conjunto de condições e circunstâncias impostas por indústrias e instituições comerciais (conflito de interesses) que podem influenciar negativamente na conduta do profissional de saúde em relação ao interesse primário (que deveria ser o bem-estar e tratamento do paciente) e a validade de pesquisas investigativas. Isso pode ser prejudicado pelo interesse secundário, como proveito econômico, desejo de notoriedade, prestígio e reconhecimento profissional. Outro exemplo de parceria com ressalvas é o Special Programme for Research and Training in Tropical Diseases (TDR) da OMS, financiado pelo Banco Mundial, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD) e a OMS. Ests programa tem por objetivo facilitar, apoiar e influenciar a colaboração científica em prol do combate das doenças tropicais negligenciadas e relacionadas com a pobreza, como malária, leishmaniose, dengue e tuberculose 31. Apesar de ser uma iniciativa do setor público, o TDR conta com a participação da indústria farmacêutica, e tal parceira foi e continua a ser cautelosamente monitorada pelo Joint Coordinating Board (JCB) do TDR. Dessa maneira, o JCB garante os interesses superiores protetivos da saúde, por intermédio do mútuo respeito entre as instituições participantes, de objetivos claramente definidos, da transparência nas prestações de conta para as agências financiadoras, assim como para o público em geral e dos direitos do setor público de propriedade intelectual que são produzidos pelos esforços conjuntos com a indústria 32.
Parcerias impossíveis
Em parcerias público-privadas, como em qualquer parceria, a necessidade de transparência e interesse mútuo é imprescindível. Assim, parcerias público-privadas com a indústria fumageira, indústria armamentista e indústria de bebida alcoólica são impossíveis de serem realizadas, tendo em vista a impraticabilidade de haver um interesse mútuo entre os dois setores. Ademais, todas as tentativas realizadas para o estabelecimento de acordos voluntários com algumas dessas indústrias não tiveram nenhum resultado positivo para a sociedade, pelo contrário, retardaram a implementação de medidas que pudessem etiquetar e reduzir sua atratividade e consumo 8.
O comércio ilícito de tabaco é um problema internacional e o seu combate é um componente indispensável para o controle do tabagismo, uma vez que o comércio ilícito mina os objetivos de saúde dos países ao enfraquecer suas políticas de aumento de preços e impostos. Um exemplo de parceria impossível é a firmada entre a International Criminal Police Organization (Interpol) e as quatro indústrias transnacionais do tabaco (British American Tobacco, Imperial Tobacco Group, Japan Tobacco International e Philip Morris International) por força da qual a Interpol utiliza o sistema de rastreio e localização de produtos do tabaco, chamado Codentify, desenvolvido pela Philip Morris International. Essa parceria entre a indústria do tabaco e uma autoridade internacional, como a Interpol, não é adequada para quem atua na defesa de práticas ilícitas que afetam a saúde, já que ela inclui a indústria do tabaco como parte no combate ao comércio ilícito, o que permite e favorece a influência dela nas políticas de controle do tabagismo e vai de encontro à implementação do Artigo 5.3 da CQCT-OMS e o Artigo 8 do Protocolo de Comércio Ilícito da CQCT-OMS 33.
Uma síntese das parcerias possíveis, possíveis com ressalvas e impossíveis é proposta na
Tabela 1 Tipos de Parceiras Público-Privadas de acordo com setores da economia e viabilidade.
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Considerações finais
Não é raro identificar empresas que se comportam como “lobos em pele de cordeiro” e realizam campanhas publicitárias milionárias para promover seus produtos nocivos à saúde, associando esses produtos à promoção de bem-estar, alegria e sucesso.
Como lidar com empresas cujo principal objetivo é o lucro? Como estabelecer uma relação “promissora e saudável” entre indústrias e profissionais de saúde em que muitas vezes existem interesses opostos? Como lidar com as empresas quando há nítido conflito de interesses? A resposta para tais perguntas é unicamente priorizar o interesse da saúde pública em proteger a população de consumir produtos nocivos à saúde, seja na regulação da publicidade, seja na redução de teores de substâncias nocivas ou na oferta de alimentos mais saudáveis.
É importante considerar a análise feita pela OMS 18 sobre quais princípios devem ser adotados a fim de tornar as PPP bem-sucedidas, lembrando que devem ser aplicados, independentemente da natureza da causa e do contexto, seja ela nacional ou internacional:
a) no caso da OMS que é composta por Estados-Membros e por um Secretariado, a tomada de decisões cabe exclusivamente aos órgãos responsáveis pela organização política do acordo, ou seja, nenhum ator não estatal pode esperar obter privilégios na mesma base que os Estados-Membros. A OMS é uma organização científica e faz suas abordagens em saúde pública com base em evidências científicas;
b) o desenvolvimento de normas, padrões, decisões políticas e as estratégias devem continuar a ser baseados no uso sistemático de provas e devem ser protegidos da influência de qualquer maneira de preconceito velado, interesse comercial ou de qualquer outra forma de influência indevida;
c) transparência é o que salvaguarda e sustenta as relações público-privadas. Esse princípio implica que a OMS torne pública a natureza de suas relações com a iniciativa privada e, por sua vez, as empresas privadas que tiveram qualquer relação com a OMS são obrigadas a tornarem públicos seus objetivos organizacionais, suas estruturas institucionais, suas fontes de financiamento e a natureza de seu relacionamento com a OMS;
d) a declaração de “Conflitos de Interesses”, seja ele real ou percebido, individual ou institucional, deve ser adequadamente gerenciada e explicitada, de modo que todos os interessados estejam cientes deles.
PPP serão exitosas somente quando houver um marco regulatório que priorize a saúde pública. Os governos e autoridades da saúde, com conhecimento científico disponível sobre os fatores de riscos para desenvolvimento de doenças, têm a obrigatoriedade de determinar o que é permitido, e as empresas devem adequar-se à regulação. Desse modo, as parcerias podem ser profícuas.
Referências
Cadernos de Saúde Pública | Reports in Public Health
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